Hannah Arendt, como se sabe, nasceu na Alemanha, foi aluna e amante de Heidegger (numa relação emocionalmente profunda de ambas as partes – ela com 18 anos, ele com 36 ), fugiu ao regime nazi e depois de uma breve prisão em França e de uma passagem por Praga e Lisboa, embarcou para os EUA onde viveu o resto da vida, primeiro como apátrida, depois com a cidadania americana.
Arendt distingue o pensamento conduzido em isolamento (como Heidegger cada vez mais isolado na cabana e no silêncio da Floresta Negra, esse lugar hoje de peregrinação) e o pensamento que constitui o diálogo do pensamento com os outros. Porque o pensamento é, ao mesmo tempo, uma inflexão interior e exterior, está fundado na experiência comum e não é uma prerrogativa de uns poucos, mas uma faculdade de todos.
Pensar é o que nos liga a nós próprios e aos outros. Arendt desenvolveu uma suspeição desse pensar isolado como um labirinto mitológico onde não se entra sem ficar preso e desligado do resto do mundo -como a obra de Heidegger que ela compara a um labirinto de raposa para atrair incautos. É aliás por isso, por pensar Heidegger, ele próprio, encurralado no seu labirinto e alienado do mundo exterior que ela lhe perdoa o seu envolvimento nazi.
A ideia de ‘pensamento’ joga um enorme papel na análise do Totalitarismo, ou melhor, a ausência de pensamento. Um mundo esvaziado de pensamento, de vontade e de juízo seria um mundo habitado por autómatos, como Eichmann, desprovidos da liberdade da vontade e de qualquer capacidade de juízo independente.
O caso de Eichmann levantou uma questão crucial para Arendt: “Pode a actividade do pensamento enquanto tal, o hábito de examinar o que acontece, independentemente dos resultados, pode esta actividade estar entre as condições que levam o ser humano a abster-se de acções más ou até, condicioná-lo contra elas?”
A questão surge, em grande parte, da sua experiência do totalitarismo nazi mas também da opressão do McCarthyismo nos anos 50, nos EUA e, de um modo geral, das linhas ideológicas presentes na Guerra Fria. Ela também via com apreensão o crescimento imparável do consumismo do Sonho Americano. Nem Hitler nem Estaline tinham esgotado, ao que parecia, todo o potencial do totalitarismo. Daí a urgência da questão.
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